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O batuque, longe de ser algo ligado à bruxaria ou, como muitos também pensam, rito característico de magia negra, com todos os mistérios que nela se ocultam, é o momento mais solene de adoração aos deuses. No candomblé, o batuque se reveste de importância toda especial porque é o momento em que a Casa de Religião se prepara para receber os deuses e, através deles, distribuir a caridade. Por isso que, na religião- afro, batuque é festa, é a dança dos orixás. Batuque é, com certeza, uma das palavras mais sagradas do candomblé.
Tão logo rufam os tambores, as entidades maiores da religião-afro fazem-se presentes. Dá-se o contato direto entre os deuses, do espaço (órum), e os humanos da terra (ayé). Isso, naturalmente, a partir da intermediação do Ministro Espiritual ou Pai-de- Santo e da sua corrente mediúnica. É o momento sublime da religião.
Nas sessões normais, todos os pedidos são encaminhados energeticamente aos orixás, via Bará-Menino, como já se disse. No batuque é diferente: é o dia em que as pessoas se aproximam, tocam e, dependendo do médium incorporado, até falam com a entidade que o montou – por isso que o médium é chamado “cavalo”, porque cede sua matéria e é “montado” por seu santo de cabeça.
Evidentemente que nem todos os filhos-de-santo podem ser montados, isto é, nem todos recebem uma entidade, pois nem todos estão “prontos”, aptos para receberem às mesmas. Esse é outro processo que independe da vontade humana. O orixá é que determina quando o filho está apto a ser montado por ele. Uma vez apto para incorporar (receber a energia do seu orixá), o filho passa a distribuir a caridade, mas, enquanto não recebe o presente da fala – “axé de fala” –, não pode falar com o consulente. É bem verdade que isso nem é necessário. Basta que o freqüentador passe por uma das entidades incorporadas e dela se aproxime, para que todos os seus desejos, todas as suas aflições e todos seus pedidos sejam captados por ela, e assim receber a energia necessária, para que seus problemas possam ser revolvidos.
No Batuque, forma-se a roda e, nela, os filhos passam a dançar, ao som do atabaque – o tamborzinho que se faz vibrar pelas mãos de um dos filhos, que é chamado “alabê”. Nessa roda, e em rígida ordem hierárquica, começando pelo Bará/Exú e chegando a Oxalá, são chamadas todas as entidades. O toque é a reza, isto é, a oração de cada orixá. Sempre que for chamada uma entidade, pela sua reza, se houver, na roda, algum médium apto a recebê-la, ela baixa e é incorporada por ele. É nesse momento que se dá o fenômeno da incorporação.
Portanto, em primeiro lugar, não há o que temer em dias de batuque. Ao contrário, felizes daqueles que têm o privilégio de participar de um deles. Afinal, achegar-se do orixá e dirigir-lhe diretamente os pedidos, os anseios, e os agradecimentos são oportunidade efetivamente rara. Além disso, é oportunidade rara porque é o único momento em que se dá o contato direto entre um homem e um orixá. Sim, porque o médium perde totalmente sua identidade pessoal, passando-a toda para sua entidade de cabeça. E como no candomblé só se trabalha com energia, com seres divinizados, todo e qualquer contato reveste-se de nobreza e raríssimo privilégio.
Importante: Voltamos a insistir para que no Batuque, o consulente não escolha a entidade que quer consultar e passe somente por uma Entidade para receber a caridade. Os poderes dos orixás são iguais, padronizados, de acordo com a função de cada um, completam-se entre si e, finalmente, torna-se o conjunto de forças que regem o universo, não sendo necessário passar por vários orixás.
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